9.10.2019—2.2.2020
SESC 24 DE MAIO,
SÃO PAULO PT EN

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DECLARAÇÃO DO JÚRI

Hoje em dia, muitos de nós compartilhamos o sentimento de que o passado, o presente e o futuro foram colapsados ou condensados em um tempo único.

Estamos perdendo a posse de nossa própria história e nossa capacidade de enxergá-la com clareza. O fascismo está em ascensão.

Vivemos sobrecarregados de imagens, sob um excesso de comunicação, que leva à falsa ideia de uma comunidade global. Estamos paralisados. O presente nos foi usurpado e se encontra agora nas mãos de uns poucos. Como responder e recuperar o comando dele, agora? Como seguir em frente? Como imaginar o futuro de nossas comunidades?

O racismo e a opressão tornaram-se endêmicos, atingindo especialmente as comunidades afro-descendentes e os povos originários. As comunidades LGBTQI+ no Brasil e em outros países estão sendo perseguidas. A Amazônia arde! Estamos sendo privados de nossos direitos civis. Isso não está acontecendo apenas no Brasil, mas em todo o mundo, de Standing Rock ao território dos povos Maxakali, de São Paulo a Tunis. Na 21ª Bienal de Arte Contemporânea Sesc_Videobrasil | Comunidades Imaginadas, vemos que muitas das obras funcionam como uma lente poética apontada para várias questões críticas do nosso tempo.

Trabalhando a partir de pontos de vista que vão do ancestral às questões raciais, das questões de gênero às diversas desigualdades, os artistas alcançaram e apresentaram resultados significativos, que tornaram o processo do júri desafiador e muito instigante. Aprendemos muito com todos – todos os trabalhos e todos os artistas. Dessa maneira, os pontos principais que procuramos nas obras foram aqueles que iam além do questionamento e do documental. Os trabalhos premiados são os que parecem nos fornecer respostas e apontar futuros possíveis.

Decidimos premiar e exaltar dois trabalhos com o Prêmio de Menção Honrosa; a Roney de Freitas e Isael Maxakali pelo filme GRIN, 2016. E Aykan Safoğlu pelo vídeo Off-White Tulips, 2013.

Os artistas Roney de Freitas e Isael Maxakali realizaram um filme altamente crítico e investigativo a partir de importantes testemunhos e imagens de arquivos. Por meio de seu próprio engajamento, foram capazes de retratar as complexas estruturas opressivas contra as comunidades Maxacali, desde a ditadura militar.

O trabalho de Aykan Safoğlu parte de uma colagem narrativa contínua de contextos pessoais, históricos e situacionais que lidam com histórias queer; pareceu-nos muito poderoso, de uma maneira sutil e com um humor particular.

Quanto aos prêmios de residência, sendo o primeiro o Prêmio de Residência Instituto Sacatar, decidimos oferecê-lo à artista Dana Awartani por sua instalação multimídia

I Went Away and Forgot You. A While Ago I Remembered. I Remembered I’d Forgotten You. I Was Dreaming, 2017. Com uma prática consistente que se baseia na expansão da ideia do universal através das manualidades e ofícios específicos de seu contexto sociocultural, a artista poderá se envolver e aproveitar a experiência proporcionada pela residência oferecida por esse prêmio, no estado da Bahia, no Brasil.

O segundo prêmio de residência, o Prêmio de Residência MMCA Residency Changdong, foi destinado a Omar Mismar por seu vídeo Schmitt, You and Me, 2016-2017. Empregando uma estratégia muito simples, o artista foi capaz de registrar uma leitura da dimensão do poder subjetivo e da violência que se multiplica hoje no estado global do mundo. Há um alto nível de cumplicidade entre o artista e sua temática, que confere novo significado à noção de engajamento.

O terceiro prêmio de residência, Prêmio de Residência Sharjah Art Foundation, foi destinado a Nelson Makengo por seu vídeo E'ville, 2018. Por meio de seu trabalho, o artista empreendeu uma importante crítica sobre as narrativas pós-coloniais provenientes do Congo. O trabalho propõe a convergência da imagem de ruínas materiais com os escombros da história e da política. O Prêmio de Residência Sharjah Art Foundation oferecerá ao artista o suporte intelectual e a infraestrutura para sua trajetória audiovisual.

O prêmio Ostrovsky Family Fund, foi destinado à artista Thanh Hoang por seu trabalho Nikki's Here, 2018. A poética dessa obra em vídeo encarna uma série de questões contemporâneas ao abordar as relações de trabalho, a intimidade e a resistência à alienação. É notável o uso da duração da obra e a inventividade do estilo visual e narrativo da artista.

Dos dois prêmios de aquisição, o primeiro Prêmio Sesc de Arte Contemporânea foi concedido ao artista No Martins por sua série de pinturas #JaBasta!, 2019. Estes retratos são uma notável declaração de afirmação e protesto. Os trabalhos se relacionam com a história da arte do retrato com uma mensagem urgente contra o racismo e a desigualdade. Empregam escala, um olhar revolucionário, políticas e mídias subversivas para criar um assertivo e poderoso chamado à ação.

O segundo Prêmio Sesc de Arte Contemporânea foi concedido ao coletivo Movimento de Luta Nos Bairros, Vilas e Favelas, por seu trabalho Conte isso àqueles que dizem que fomos derrotados, 2018. O vídeo representa uma ação coletiva, significativa dos movimentos sociais e civis que respondem à injustiça no Brasil, que por sua vez correspondem em grande parte a todo o mundo. O trabalho fala a um presente de suspense e a um futuro social desejado. A lente ativa se combina à ação da comunidade. O resultado é tremendamente vibrante.

O júri concordou por unanimidade em conceder o prêmio Estado da Arte à artista Gabriela Golder por sua seminal instalação de vídeo em quatro canais, Laboratorio de invención social (O posibles formas de construcción colectiva), 2018. Este trabalho é um acúmulo de conhecimento de coletivos e cooperativas para criar uma ferramenta eficaz de mudança, destinada a trabalhadores de todo o mundo. A artista apela ao agenciamento de possíveis maneiras de controlar e organizar a economia, em direção à equidade. Trata-se de uma possível fórmula descolonizadora, de resistência às realidades e ruínas capitalistas e industriais. A instalação propõe uma sincronicidade visual, relacionando seres humanos, máquinas e os resultados de seu trabalho, para criar uma unidade de vozes, ações e vidas.

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