VIDEOMEMÓRIA

 

Hoje, as possibilidades de registro e edição de imagens encontram-se ao alcance de parte expressiva da população, tornando-se cada vez mais disseminadas graças aos dispositivos digitais. Incorporada à rotina, tal prática gera quantidades imensuráveis de arquivos fotográficos e de vídeo, que narram imageticamente existências que já não dependem dos chamados “quinze minutos de fama” para se tornarem conhecidas, dado o descarregamento sistemático dessa iconografia nas plataformas de internet. Esse caudal abrange, além disso, a circulação de todo tipo de imagens analógicas do passado, por meio de sua digitalização e difusão. Atentos ao fenômeno e negociando com ele, artistas e curadores valem-se da hiperprodução visual distribuída para refletir sobre memórias coletivas, com as lembranças e esquecimentos vigentes nas narrativas históricas e sociais relativas a povos, nações e regiões.

“A memória é uma ilha de edição”, expressão emprestada de Waly Salomão para dar nome à 22ª Bienal Sesc_Videobrasil, convida a pensar nos processos de seleção e exclusão de elementos para a formação de relatos a respeito de culturas e identidades situadas nas margens dos centros de poder e privilégio. Nesta bienal, que marca os quarenta anos de atividade do Videobrasil, o vídeo representa metáfora da passagem do tempo e da produção de memória, haja vista a importância do movimento, da montagem e do encadeamento de fatos audiovisuais na sintaxe dessa linguagem técnica. Ela figura, aliás, como mídia principal entre os artistas aqui envolvidos, em diálogo com tecnologias ancestrais. Oriundos do Sul Global, esses criadores indagam histórias marcadas por diferentes formas de colonização.

A ideia de memória é sondada em sua polissemia por diversos artistas a partir de suas trajetórias pessoais, mediante experimentações com a textualidade, o corpo, itens alimentares, além de materialidades sonoras e recursos colhidos de games. O sentido da memória também comparece no plano institucional, quando considerada a duradoura parceria entre o Sesc e a Associação Cultural Videobrasil. Desde os anos 1990, as organizações vêm estimulando a pesquisa e a produção de agentes em atividade fora dos enclaves euro-americanos de poder. A realização desta edição serve de oportunidade para evocar a origem da Bienal, com o espaço que ela abre para intercâmbios entre artistas de diversos países, e entre estes e os públicos, com ênfase nas experiências de formação crítica acerca da cultura global, com suas assimetrias.


Danilo Santos de Miranda
DIRETOR DO SESC SÃO PAULO